sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Solitude


Quero ficar só...
Preciso ouvir o silêncio
Que me sussurra segredos
Pra descobrir o que me dói
Porque em minh´alma há um peso,
No meu peito um aperto,
E na garganta um nó.

Luciano Borges

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

O Jesus que eu nunca conheci


Uma das barreiras que pode ser empecilho para expandir nosso conhecimento pode ser o conhecimento adquirido (sobretudo no campo religioso). Esse conhecimento adquirido e sedimentado funciona como uma espécie de trincheira onde nos escondemos e nos protegemos do novo que não poucas vezes ameaça nos desestabilizar. Sair da trincheira para enfrentar o novo de peito aberto é um ato de coragem heróica que poucos estão dispostos.
Faço parte de uma geração que conheceu um Jesus midiático, pintado com fortes traços heróicos e triunfalistas, um Jesus que pouco tem de humano. Mas há alguns meses resolvi sair da trincheira e me expor de peito aberto ao texto bíblico do evangelho de Marcos, tentei permitir que minha visão de Jesus Cristo fosse remodelada a partir de uma nova leitura, uma leitura desarmada e despretensiosa do evangelho em busca de Jesus, o homem de Nazaré. Confesso que minha experiência foi marcante, pois vi abrir-se diante de mim possibilidades que até não havia notado. Descobri no evangelho...

Um Jesus demasiadamante humano.
Tenho a impressão que a humanidade de Jesus, embora um dos pontos fundamentais afirmados nos dogmas do cristianismo, ficou submersa em sua divindade. Pouco se fala de sua humanidade e de aspectos que dizem respeito a ela, tais como: sua fragilidade, suas angústias, seu drama. Por outro lado, a sua divindade, como uma espécie de “algo a mais”, tornou-se o grande trunfo nas mãos daqueles que acreditam que ela torna o cristianismo superior a outras crenças e religiões. Contudo, é claramente perceptível no evangelho que a humanidade de Jesus não foi apagada por sua divindade, nem se tratava de uma humanidade melhorada, mas sua humanidade foi um mergulhar no mais profundo do drama humano e vivenciar esse drama em toda sua intensidade, Jesus realmente chorou a morte de Lázaro, sentiu a dor da rejeição de Jerusalém, se angustiou diante da iminência de seu sofrimento. Em sua humanidade Jesus vivenciou a mais profunda negatividade, o teólogo católico Andrés Torres Queiruga fala de Jesus como o “ proletário absoluto”.
Mas é a partir dessa humanidade que emerge uma possibilidade, como homem Jesus introduziu no mundo uma incômoda contradição. Sem ele teríamos apenas um modelo de humanidade, o que se encontra ao nosso redor e em nós, marcada pelo egoísmo, pela ganância, pelo orgulho, mas quando Jesus assumiu a humanidade com todas as suas implicações e tensões ele introduziu na história humana um modo diferente de ser humano.

Um Jesus crítico da religião.
Não há dúvidas que Jesus nasceu e viveu dentro de um sistema religioso, o judaísmo, um sistema no qual as regras já estavam estabelecidas e no qual não cabiam questionamentos. Embora Jesus tenha nascido dentro dessa realidade e a assumido como prática pessoal (Jesus freqüentava a Sinagoga e o templo, orientava outros a cumprirem as práticas culticas) não se mostrou indiferente em relação aos aspectos opressores, desumanos e exploradores que a permeavam.
Ele não se calou diante dos abusos para com as interpretações da Lei, quando as tradições dos homens sufocavam seu real sentido, não se submeteu às amarras que a guarda do sábado impunha tornando o homem um escravo, não se mostrou indiferente ao sistema exploratório do templo que chegava a ponto de tirar até as únicas moedas de uma pobre viúva, não poupou críticas aos religiosos.
Em sua relação com a religião Jesus não foi um mero receptor submisso que acolhia tudo passivamente, mas se relacionou de maneira crítica, de forma que, ao mesmo tempo em que vivenciava essa piedade também denunciava seus aspectos pervertidos.

Um Jesus acolhedor dos indignos.
Se olharmos para as pessoas que formavam o grupo dos discípulos de Jesus, para a multidão que o cercava ou até mesmo para os pecadores e publicanos com os quais compartilhava da mesa, fica claro que Jesus fez uma opção por aqueles que eram excluído e considerados indignos. Entre seus discípulos havia um cobrador de impostos e um zelote, a multidão (ochlos no grego) estava sempre ao seu redor, acolheu crianças, e, interessante, entre os mais chegados de Jesus não havia nenhum fariseu, saduceu ou sacerdote.
É no mínimo intrigante a opção de Jesus de caminhar ao lado de tais pessoas, uma vez que se esperava que o Messias, para bem de sua credibilidade, fosse alguém mais seletivo na escolha daqueles que estariam ao seu lado (diga-me com quem andas e direi quem és), contudo, com essa opção Jesus revela que o Reio de Deus não é exclusivo, mas inclusivo, Jesus mostra também que a Graça de Deus (favor imerecido) não levar em conta os créditos e perdoa os débitos.
A atitude de Jesus em relação aos indignos não foi uma provocação para causar escândalos às pessoas de seu tempo, mas uma antecipação, um desvelamento do que é o Reino de Deus.

Um Jesus como modelo de vida.
Por fim,(sem exaurir o assunto) descobri que a vida de Jesus no evangelho, tem como objetivo servir como paradigma para nossa vida. Por esse motivo seu modo de viver não deveria passar despercebido aos nossos olhos. Sua postura diante dos que sofrem, sua obediência amorosa a Deus, sua abnegação, sua compaixão, sua disposição para servir e até seu sofrimento. Jesus não nos deu um mapa para o céu, mas diretrizes para vivermos nesse mundo com valores e princípios mais elevados. Aliás, ser discípulo significa aprender com as atitudes do mestre e tomá-las como modelo e como critério de auto-exame. Assim percebi que Jesus não veio a esse mundo para fazer de nós pessoas felizes, mas para nos mostrar como podemos ser pessoas melhores: mais justas, mais honestas, mais bondosas, ele é o nosso paradigma.

Por maior que seja o tempo de convivência com uma pessoa não é possível afirmar que a conhece completamente, nosso conhecimento do outro é sempre superficial. Assim também podemos falar de nossa experiência com Jesus, por mais que o conheçamos há sempre algo novo a ser conhecido e abrir-se a renovação do nosso conhecimento não significa opção por caminhar no chão escorregadio do relativismo, mas consciência das nossas limitações e conseqüentemente, das possibilidades de crescer. Olhar para Jesus e percebê-lo a partir de uma outra perspectiva não significou negar tudo que aprendi, mas enriquecer e ampliar meu horizonte e perceber a amplitude do desafio de andar com Jesus.


Luciano Borges