quinta-feira, 12 de junho de 2014

É necessário queimar os hereges

 
No dia 01 fevereiro, na sede da editora Fonte Editorial ocorreu o debate de lançamento do livro É Necessário Queimar os Hereges do meu amigo Dr. Leandro Thomaz de Almeida. O livro é polêmico e certamente, para alguns, perturbador. Propõe um outro olhar para os acontecimentos em torno da Reforma Protestante do século XVI, sobretudo para o fervoroso debate envolvendo de um lado João Calvino e Theodoro Beza e Sébastien Castellion de outro. Pode-se dizer que o livro faz um resgate histórico ao revelar o “outro lado da moeda” legado à ignorância, talvez por causa da escolha por uma leitura idealista e tendenciosa da história do protestantismo.


O livro se estrutura em torno de Sébastien Castellion, personagem nada conhecido entre nós que corajosamente se opôs a Calvino e Beza quando da morte do médico espanhol Michel de Servetus, ocasionando a partir dessa querela discussões em várias direções, tais como tolerância religiosa, o emprego do magistrado civil na condenação de “hereges”, a questão da interpretação bíblica, liberdade de pensamento, etc. 
 
Penso que esse livro chega até nós propondo como que um acerto de contas, uma reparação por quase cinco séculos de uma leitura unilateral da história do protestantismo. Mas, para além do resgate histórico, É Necessário Queimar os Hereges lança luz sobre nosso tempo, faz compreender a nós mesmos e expõe à luz do dia práticas repressivas e mecanismos de contenção que acreditávamos serem próprios de um tempo passado de obscuridade e ignorância. Aqui nos damos conta que, do ponto de vista eclesiástico não avançamos tanto quanto pensamos.
 
O autor afirma que sua intenção foi apenas introduzir o pensamento de Castellion, o que fez muito bem. Contudo além de introduzir as idéias de um pensador praticamente desconhecido para nós protestantes do século XXI, esse livro tem sobre o leitor atento e honesto um efeito mais profundo, ele não apenas resgata o passado, mas também desvenda o presente. Kafka dizia: “os livros dos quais temos necessidade são os que caem sobre nós como a desgraça, que nos perturbam profundamente como a morte de alguém que amamos mais do que a nós mesmos, como um suicídio. Um livro deve ser como uma picareta que rompa o mar de gelo que está dentro de nós.” É Necessário Queimar os Hereges é esse livro.

Luciano Borges