quinta-feira, 23 de dezembro de 2021

A MANJEDOURA E A CRUZ


“Aquele que é a Palavra tornou-se carne e viveu entre nós. Vimos a sua glória,...” (João 1.14)

Quando uma criança nasce, logo os pais se põe a refletir sobre o que será aquele bebê quando crescer. Como quem tenta espiar por um buraquinho entre o presente e o futuro, se esforçam para enxergar aquilo que no agora está oculto.
Quando leio o relato do nascimento de Jesus, penso não ter sido diferente com José e Maria que, apesar de terem sido divinamente comunicados, certamente em suas expectativas carregavam muitas coisas em aberto.
Pouco mais de três décadas depois, indigentemente pendurado numa cruz estava Jesus de Nazaré sob a acusação: “rei dos judeus”. Possivelmente José já fosse falecido, mas Maria, agora trinta anos mais velha, acompanhou aquela triste cena, como desfecho de uma trajetória de vida que destoava dos anúncios em torno do seu nascimento.
Há algo aparentemente contraditório nisso tudo. Aquele bebê, embora nascido de forma humilde, insinuava ser no futuro algo grandioso. Mas que grandeza há num crucificado? Que glória há num homem exposto publicamente em agonia de morte? É que na sua morte terrível está maior e mais inequívoca lição de amor que já se viu e ouviu.
Luciano Lourenço Borges

terça-feira, 14 de abril de 2015

Sobre a ressurreição

“...o homem que não assimilou a beleza desta vida, não pode compreender o significado da ressurreição”

Karl Barth

sábado, 31 de janeiro de 2015

Sim e não

Você quer sempre um sim,
Mas se lembre, nem sempre o sim é bom;
Muitas vezes recebemos o sim,
Mas, sequer percebemos que o sim é não.

Luciano Borges

quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

Seguir Jesus

“Segui-lo, dizia o evangelho: compartilhar sua vida, deixar-se impregnar por seu estilo, senti-lo como companheiro em nosso caminho. E já sabemos, porque ele mesmo o disse, que para esse caminho não se necessita de alforjes: não é preciso uma cultura especial nem determinado grau de brilho ou de poder social. Seguí-lo e pronto: com o coração bom de quem se preocupa de verdade com os demais; com a humildade de quem conhece o sabor do perdão; com a confiança de quem sabe que tem um Pai. Segui-lo porque podemos encontrá-lo: na leitura espontânea do evangelho, com o coração aberto, no trabalho sincero pelo irmão; na vivência multiforme do amor. Segui-lo sabendo que o seguimento nos aproximará uns dos outros e transformará nosso mundo”


Andrés Torres Queiruga (Livro: Repensar a cristologia)

quinta-feira, 12 de junho de 2014

É necessário queimar os hereges

 
No dia 01 fevereiro, na sede da editora Fonte Editorial ocorreu o debate de lançamento do livro É Necessário Queimar os Hereges do meu amigo Dr. Leandro Thomaz de Almeida. O livro é polêmico e certamente, para alguns, perturbador. Propõe um outro olhar para os acontecimentos em torno da Reforma Protestante do século XVI, sobretudo para o fervoroso debate envolvendo de um lado João Calvino e Theodoro Beza e Sébastien Castellion de outro. Pode-se dizer que o livro faz um resgate histórico ao revelar o “outro lado da moeda” legado à ignorância, talvez por causa da escolha por uma leitura idealista e tendenciosa da história do protestantismo.


O livro se estrutura em torno de Sébastien Castellion, personagem nada conhecido entre nós que corajosamente se opôs a Calvino e Beza quando da morte do médico espanhol Michel de Servetus, ocasionando a partir dessa querela discussões em várias direções, tais como tolerância religiosa, o emprego do magistrado civil na condenação de “hereges”, a questão da interpretação bíblica, liberdade de pensamento, etc. 
 
Penso que esse livro chega até nós propondo como que um acerto de contas, uma reparação por quase cinco séculos de uma leitura unilateral da história do protestantismo. Mas, para além do resgate histórico, É Necessário Queimar os Hereges lança luz sobre nosso tempo, faz compreender a nós mesmos e expõe à luz do dia práticas repressivas e mecanismos de contenção que acreditávamos serem próprios de um tempo passado de obscuridade e ignorância. Aqui nos damos conta que, do ponto de vista eclesiástico não avançamos tanto quanto pensamos.
 
O autor afirma que sua intenção foi apenas introduzir o pensamento de Castellion, o que fez muito bem. Contudo além de introduzir as idéias de um pensador praticamente desconhecido para nós protestantes do século XXI, esse livro tem sobre o leitor atento e honesto um efeito mais profundo, ele não apenas resgata o passado, mas também desvenda o presente. Kafka dizia: “os livros dos quais temos necessidade são os que caem sobre nós como a desgraça, que nos perturbam profundamente como a morte de alguém que amamos mais do que a nós mesmos, como um suicídio. Um livro deve ser como uma picareta que rompa o mar de gelo que está dentro de nós.” É Necessário Queimar os Hereges é esse livro.

Luciano Borges

quinta-feira, 10 de abril de 2014

Pessoa

Se eu pudesse trincar a terra toda
E sentir-lhe um paladar,
Seria mais feliz um momento...
Mas eu nem sempre quero ser feliz.
É preciso ser de vez em quando infeliz
Para se poder ser natural 

Nem tudo é dias de sol,
E a chuva, quando falta muito, pede-se.
Por isso tomo a infelicidade com a felicidade
Naturalmente, como quem não estranha
Que haja montanhas e planícies
E que haja rochedos e erva... 

O que é preciso é ser-se natural e calmo
Na felicidade ou na infelicidade,
Sentir como quem olha,
Pensar como quem anda,
E quando se vai morrer, lembrar-se de que o dia morre,
E que o poente é belo e é bela a noite que fica...
Assim é e assim seja... 

Alberto Caeiro

Amor de Deus


Te amo, não porque me amas
Te amo porque não sei não te amar 
 
Te amo irresponsavelmente,
Como quem não se importa com nada
Te amo intensamente,
Como se nada mais existisse 
 
Embora amar seja tornar-se frágil
Te amo sem medo e sem ressalva
Com amor grande, com amor sublime
Totalmente entregue à coisa amada. 
 
Luciano Borges